O termo burnout tem se tornado comum no dia-a-dia: vemo-lo a passar em publicações nas redes sociais, a aparecer nas notícias e a entrar nas nossas conversas. O que significa este termo? De acordo com o ICD-11 (International Classification of Diseases), o burnout é estabelecido como uma síndrome relacionada com o local de trabalho e resultante de stress crónico que não tenha sido bem gerido (WHO, 2022). Alguns autores referem que pode também ser resultante de um ambiente de trabalho stressante e perante poucos recursos para fazer face às diversas exigências presentes no mundo laboral (Maslach et al., 2001).
Para percebermos melhor os efeitos do burnout, é importante aprofundar a sua sintomatologia e, de facto, esta síndrome apresenta três dimensões: sentimento de exaustão / exaustão emocional; aumento da distância mental (ou despersonalização) ou negativismo ou cinismo em relação ao emprego / descomprometimento; sensação de falta de realização pessoal e / ou ineficácia. E o que quer isto tudo dizer? A exaustão emocional é individual e refere-se a um estado de sobrecarga emocional associado à falta de recursos emocionais do próprio para lidar com algo relacionado com o trabalho. Em relação à despersonalização, é uma resposta de afastamento excessivo em relação aos outros, no contexto laboral e sublinha-se como uma componente relacional. No que concerne à ineficácia, é a diminuição do sentido de produtividade e competência, percecionado pelo próprio, sendo por isso, uma componente de autoavaliação (Maslach, 1998).
Esta doença “moderna” e que ganhou muita popularidade a partir dos anos 70, é transversal a várias profissões, embora os profissionais de saúde estejam mais vulneráveis. Ainda assim, também podemos falar de burnout nos estudantes, na parentalidade e nas mulheres no pós-parto. Isto significa que os investigadores já extrapolam esta síndrome para vários contextos, embora o ICD seja taxativo: burnout é em contexto laboral. Seja como for, importa identificar os sinais, saber pedir ajuda e modificar alguns padrões que podem estar a afetar as nossas vivências.
A própria expressão em inglês tem impacto: burnout. Creio que em português não teria o mesmo resultado. Numa tradução mais literal, significa “deixar de arder”, ou “apagar”. Originalmente, este termo surgiu como uma metáfora, fazendo a ligação para uma perda de energia constante que implica que o “fogo” já não possa continuar a arder. Já não conseguimos alimentar essa chama. Então, já exaustos, continuamos a trabalhar, mas sem conseguir dar resposta, o que leva a consequências para o próprio e também para a organização onde está inserido. Claro que, numa sociedade cada vez mais competitiva, veloz, exigente e com mudanças rápidas e constantes a nível social, cultural e económico, ficou criado o vento que teima em “apagar” a nossa eficácia, presença e estabilidade emocional.
E onde nos leva o burnout?
Esta síndrome está associada a perturbações depressivas, do sono, da ansiedade, dificuldades cognitivas (afeta a atenção e a memória), doenças cardiovasculares e a baixas de longo termo. Referindo alguns sintomas mais específicos: dificuldades de concentração; em se recordarem de algo (principalmente de curto prazo); falta de energia; uma tristeza imensa (acompanhada por uma inundação enorme, ou seja, a pessoa não consegue regular-se emocionalmente); perda de apetite; perda de interesse, entre outros. A nível corporal há hipotonia (o corpo perde tónus / carga), os membros apresentam-se deflacionados, a pele mais baça, o olhar perdido e os ombros mais descaídos. Estes são alguns exemplos que podem ou não ser encontrados, pois a complexidade desta condição é grande e a sua demonstração é variável.
A grande problemática do burnout é que, quando a chama apaga, é difícil voltar a acendê-la. Trata-se de um daqueles problemas em camadas, pois as problemáticas associadas a esta síndrome são variadas. Outro grande desafio é que o burnout e os seus sintomas residuais mantêm-se a longo prazo, mesmo na ausência do enquadramento stressor (o trabalho ou outro) e tem consequências diretas e nefastas e em inúmeras áreas de vida (saúde física, psicológica e vida social) (Almén, 2021; Schaufeli et al., 2009).
O que fazer?
O tratamento do burnout deve ser feito de forma multidisciplinar, envolvendo claramente a psicoterapia. É importante não esperar até que a chama se apague por completo para pedir ajuda. E como em muitas das temáticas da saúde mental, é fundamental trabalhar na prevenção! E podemos fazê-lo de várias formas:
- A nível individual:
– Cuidar da alimentação
– Fazer exercício
– Procurar cumprir as horas de sono
– Desenvolver competências para lidar com o stress
– Equilibrar melhor a vida pessoal e laboral
– Evitar o consumo de álcool e tabaco
– Promover relacionamentos saudáveis com os colegas
- A nível interpessoal:
– Alertar os colegas para a temática, principalmente se encontrarmos sinais de burnout
- Numa posição de coordenação:
– Refletir sobre possibilidades para diminuir a sobrecarga de trabalho
– Procurar escutar o outro nas suas necessidades e ajudá-lo a alcançar esses desafios
– Verificar se é possível distribuir equilibradamente o volume de trabalho
– Se necessário, procurar formação em liderança
Referências
- Almén, N. (2021). A cognitive behavioral model proposing that clinical burnout may maintain
itself. International Journal of Environmental Research and Public Health, 18(3446).
https://doi.org/10.3390/ijerph18073446
- Maslach, C. (1998). A multidimensional theory of burnout. In C. L. Cooper (Ed.), Theories of
Organizational Stress (pp. 68–85). Oxford University Press
- Maslach, C., Schaufeli, W. B., & Leiter, M. P. (2001). Job burnout. Annual Review of Psychology.
52, 397–422. https://doi.org/10.1146/annurev.psych.52.1.397
- Schaufeli, W. B., Leiter, M. P. & Maslach, C. (2009). Burnout: 35 years of research and practice.
Career Development International, 14(3), 204-220.
https://doi.org/10.1108/13620430910966406
- World Health Organization (2022). ICD-11 for Mortality and Morbidity Statistics. Acedido a 21
de fevereiro de 2022 em https://icd.who.int/browse11/l-m/en
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