Há muito tempo atrás ouvi a frase “as pessoas não mudam, revelam-se”. Uma frase carregada de muita coisa. Realmente, o facto de uma pessoa mudar ou não, seja o seu comportamento, atitudes, forma de lidar com os outros, sempre obteve algum fascínio por parte do ser humano. Nas relações pessoais queremos sempre entrar no entendimento do outro e, quem sabe, moldá-lo para aquilo que queremos ou precisamos. Na frase que referi parece que quando as pessoas têm tendência para nos magoar, elas revelam-se e, aparentemente, revelam o seu pior. A própria frase parece ser revestida de alguma negatividade e fatalismo. Como um fado na defensiva.
Será que somos seres fixos?
Depois ouvi que, de facto, o ser humano não muda, que a personalidade tem elementos fixos. Fiquei na dúvida, será que vivemos casmurros para todo o sempre? No entanto, estamos claramente sob a influência do mundo externo, a vida acontece e muda-nos os planos e nós temos de nos flexibilizar. Foi assim que aprendi a frase: “as pessoas não mudam, adaptam-se”. Numa relação a dois o tempo ensina-nos a flexibilizar as nossas opções, atitudes e comportamentos. E aqui é importante perceber aquilo que por vezes pode ser uma ténue diferença entre adaptação ao outro e perda de individualidade. No fundo não deixamos de ser nós, mas ao procurar a adaptação plena, ao procurar que o outro goste de nós, transformamo-nos naquilo que o outro quer. Por momentos deixamos de ter a nossa identidade, desenvolvem-se relações codependentes. Mas a identidade está lá, embora não haja provavelmente mudança, existirá talvez uma amnésia seletiva de comportamentos. Uma escolha que se torna pesada com o tempo e uma pele difícil de despir. No lado saudável, uma boa adaptação pode promover uma grande harmonia que faz com que as pequenas coisas não se transformem em grandes batalhas.
Quem muda, afinal?
Num outro momento ensinaram-me outra frase: “se as pessoas não mudam, mudamos nós”. E mudar o quê? Simplesmente mudar a forma como lidamos com a não mudança do outro. E aqui podem existir tantas formas. A melhor é claramente encontrar paz dentro de nós e não permitir que as poluídas não mudanças do outro nos afetem. Se o outro continua no seu registo, se já gastámos as palavras a tentar fazer ver outros pontos de vista, se já tentámos ajudar vezes sem conta e os mesmos erros continuam a ocorrer, então é hora de aceitar. Mudamos a nossa perspetiva, aceitando que o outro é como é. Aceitar a sua infelicidade, os seus insucessos e permitir que eles fiquem com o seu dono que, aparentemente, não se quer livrar deles, ou ainda não está preparado para o fazer. Se calhar o medo de ficar vazio é tão grande que assim sempre têm alguma coisa…
Sim, a mudança é possível, mas…
É importante sublinhar que há uma continuidade no comportamento humano, ou seja, as atitudes não têm de ser rígidas e estanques, caso contrário não faríamos psicoterapia. A psicoterapia tem esse dom. E é aliás uma das coisas que devemos dizer nas primeiras sessões: é possível que faça alguns ajustes ao seu comportamento e emoções, e que isso tenha impacto nas pessoas que o rodeiam. Então sim, as pessoas mudam. A questão é que não mudam quando queremos ou como queremos. Tem de ser uma chamada interna, uma vontade própria e um caminho criado e trilhado pelo próprio.
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