Estamos a viver algo novo na nossa contemporaneidade. Forçados a uma clausura em busca do saudável, encontramo-nos despidos de pertences, estatutos ou materialismos. Ficamos “quase” iguais nisto: temos de ficar em casa. Exceção clara para os heróis que têm ido trabalhar, sejam da área da saúde, da disponibilização de bens tão importantes ou de serviços essenciais, como o que permite que me leiam neste momento.
Vemos o egoísmo em quem compra mais do que precisa, mas também a solidariedade dos que colocaram recados nos prédios para ajudar os vizinhos. Lamentamos os que se aproveitam de tudo isto para fazer negócio, mas saudamos os que continuam a sair de casa para fazer voluntariado, para continuar a cuidar dos nossos idosos em lares ou tomar conta da nossa segurança, patrulhando ruas quase vazias.
No meio de tudo isto sei que é um momento de recolhimento interno. Não só para as nossas casas, mas também para dentro de nós. E às vezes quando olhamos para nós não gostamos do que vamos encontrar. Por muito que não queiramos fazer autoanálise, abrandar ou parar tem esta benesse (ou malefício para alguns): olhar para o que ficou, o que é e o que queremos que seja depois de tudo isto.
Mas nenhum homem ou mulher é uma ilha. Isolados, acabamos por estar mais perto uns dos outros, graças às novas tecnologias e até mesmo às varandas. Temos concertos online, visitas virtuais a museus e monumentos, aulas de exercício físico e tantas outras coisas. Nessa distância há uma janela de oportunidade: a de nos encontrarmos. Embora falte o holding que a proximidade, o toque e o afeto dos outros nos dá, manter o contacto e falar com quem não falamos há tanto tempo, poderá dar uma sensação de proximidade e de conforto. Ainda assim, para quem vive sozinho ou está sozinho em casa, é um enorme desafio. Por isso contactem com essas pessoas, conectem-se e perguntem como é que elas estão e como estão a lidar com tudo isto. Às vezes uma mensagem apenas pode fazer uma grande diferença.
Entre o pessimismo e o otimismo, quero escolher o otimismo, que me diz que algo de bom poderá sair de tudo isto, embora o lado negativo da doença e da morte tenha sempre um enorme peso. A lição para já é a de olhar para dentro, entrar em contacto com o outro, mantendo a proximidade: longe do toque, mas próximo do coração.
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