PSICOTERAPIA CORPORAL

Estás a ver a foto ou o filme?
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Estás a ver a foto ou o filme?

Não sei se foi da imaturidade ou da falta de conhecimento que a psicoterapia veio colmatar, mas quando era nova eu julgava muito os outros. Hey, que atire a primeira pedra… Era fácil, todos o faziam e era só abrir a boca. Fosse denominado de “cusquice” ou análise de aldeia, era uma coisa de grupo. Mas por que raio fazíamos isso? Havia um senso de: se colocamos o outro do outro lado da ponte (permitam-me a redundância), então nós estamos todos aqui juntinhos. O outro já é o outro quando o chamamos de outro, não é? E assim afastamo-nos, criamos cisões, separações, comparações, competições.

À medida que fui crescendo, conhecendo mais histórias, fui juntando peças e fazendo um filme mais completo de quem me rodeava. Era preciso muito mais do que um frame para entender de onde vem o olhar do outro. Mas foi ao tornar-me psicoterapeuta que a máxima “não julgarás” se instalou. Não sabemos a história do outro. Isto é mais do que aquela coisa da empatia, de andar nos sapatos dos outros. Vai mais além, pois é um lugar de não julgamento onde não vamos ter as peças todas do puzzle, nunca. Por mais que possamos conhecer o outro, quem liga essas peças é ele próprio. Então o nosso olhar será sempre através da nossa lente, da nossa experiência, conhecimento e sensações. E por isso é preciso ter cuidado e estar alerta para vermos se o senhor juiz entra na sala.

Foto ou filme?

Hoje em dia, como psicoterapeuta, quando o cliente traz esse julgamento, tento ver com a pessoa que tenho à minha frente o que é que ela não quer ver nela própria. Quando habitamos esse lugar de apontar o dedo ao outro, quantos dedos estamos a apontar a nós, inconscientemente? De onde queremos fugir? É um processo longo e muitas vezes, se aliado a uma enorme desresponsabilização, pode ser muito desafiante ou algo para trabalhar durante toda a vida.

Então, nessa maratona, percebi que quando nos apontam o dedo, estão a apontar para uma fotografia. Um photofinish que não diz como é que foi a corrida, quantas quedas foram dadas ou quantas foram as voltas à pista. Não estão a ver o filme todo. E ver o filme todo inclui ver os créditos, o documentário que fizeram sobre o filme e até mesmo saber a marca das câmaras que usaram. Detalhista? Não, é simplesmente a vida do outro, não a tua. E de facto, somos todos diferentes e construímos a nossa realidade de forma distinta. Isto não tem só a ver com gostar mais de determinada cor, tem a ver com opções de vida, políticas, sociais ou relacionais.

Se for ao contrário e sentes que te julgam com facilidade, se te apontarem um dedo, lembra-te: estão a ver a foto, não estão a ver o filme. Mas que isto não te desresponsabilize daquilo que é teu e do caminho que tens de traçar no teu processo pessoal.

Foto de dusan jovic em Unsplash

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